51:41
IRMAOS LUMIERE
624
A REGIÃO DA PROVENÇA, NO SUL DE FRANÇA, NA EUROPA. Se é verdade que a natureza molda os caracteres, também estes costumam moldar a paisagem a seu gosto. Na Provença, a uma natureza sem sobressaltos,…Mais
A REGIÃO DA PROVENÇA, NO SUL DE FRANÇA, NA EUROPA.

Se é verdade que a natureza molda os caracteres, também estes costumam moldar a paisagem a seu gosto. Na Provença, a uma natureza sem sobressaltos, onde um céu quase sempre azul pontifica sobre um relevo harmonioso, sem mais dramatismos que não seja o despontar de uma fraga cinzenta numa seara, corresponde uma presença humana igualmente discreta e sem grandes surpresas.

Mas há pequenas surpresas: rios antigos que cavaram gargantas na rocha arenosa, colinas avermelhadas de ocre, aldeias feitas da mesma pedra e da mesma cor do chão de onde se levantam, construídas em lugares inexpugnáveis. E também a surpresa da água, que brota em nascentes ocultas, ou entra, salgada, pela terra dentro em canais estreitos, misturando ao verde seco do "maquis" o azul intenso do mar Mediterrâneo.

Podemos começar a descoberta pela costa. Marselha, por exemplo, para que o contraste da grande cidade com estes lugares, dos mais belos do Sul de França, realce ainda mais a pacatez e a rusticidade do interior da Provença.

Da praia para o campo e numa área relativamente pequena, passamos por alguns destinos menos conhecidos dos visitantes estrangeiros, mas que mantêm ainda um charme de outros tempos, aliado a uma beleza natural igualmente bem preservada.

Na região da Alta Provença, as montanhas salpicadas de aldeias típicas perdem-se no horizonte de intermináveis extensões cultivadas de um azul elétrico inconfundível. O chamado “ouro azul”, com o seu aroma silvestre, impregna toda a região e forma um idílico quadro. Desfrute ainda das Gargantas de Verdon, um território autêntico com o mais profundo desfiladeiro da Europa, atingindo os 700 metros de profundidade; de Nice, a cidade mais emblemática da Côte d’Azur e do Mónaco, o emblemático Principado.

Levada pelo tempo e invadida pelo turismo, a Provença quase desapareceu, transformando as suas cidades pacatas em metrópoles atarefadas, e os seus pequenos portos de pescadores em praias da moda, pejadas de gente ao sol. Venceram os que apenas viam nesta terra um oásis de bom tempo, com tardes de sesta e jogos de "pétanque" ao som das cigarras. Mas ainda há lapsos nesta conquista. O segredo para os encontrar é trocar as horas – melhor ainda, as épocas; a primavera e o outono, o princípio da manhã e o fim da tarde, são as épocas favoritas para os descobridores nostálgicos da Provença.

No delta do rio Ródano fica a Camarga, que é como como um “triângulo cheio de pássaros e de touros”. Com um indisfarçável cheiro a Espanha, aqui cultiva-se as cavalgadas por entre os canaviais e as salinas, manchadas de púrpura pelos flamingos. A “festa brava” são touradas pacíficas, em que o touro provavelmente se diverte tanto como as pessoas e, no fim de Maio, milhares de "romani" (ciganos nómadas) de todo o mundo chegam a "Li Santi Mario de la Mar" (Les Saintes Maries de la Mer), juntando-se à grande comunidade cigana da zona numa peregrinação ao túmulo de Santa Sara – inesperado, este é o primeiro retalho da Provença que encontramos, vindos dos Pirenéus.

Se continuarmos pela costa passamos por Marselha, cidade rusticamente latina, e acabamos na elegante Riviera-Côte d’Azur, em Nice, Cannes, Saint-Tropez, afastando-nos cada vez mais da Provença profunda. Já quase na fronteira italiana fica o mundano Mónaco e a sua antítese, os Alpes. Magníficos, participam na “glória da Provença e na nobreza das montanhas”.

Mas não é em redor dos seus picos nevados que encontramos a esporádica sinalização em "provençó", língua local que teve o apogeu na poesia trovadoresca, decaindo agora para nomes de restaurantes e outros serviços turísticos.

Não é daqui o clima luminoso que se espalha pelas colinas cobertas de arbustos e vinhas, nem os campos de oliveira e alfazema, protegidos do mistral por áleas de ciprestes e choupos. Onde está a Provença antiga e perfumada, a dos saquinhos de ervas que se guardam na gaveta da roupa branca, dos montes de feno, dos campos de papoilas, lírios e girassóis, colados à tela pelas pinceladas fortes de Van Gogh? E as pequenas aldeias de pedra dispostas em flancos de montanha, de onde se descobre uma paisagem composta de “nove décimos de céu e um pequeno décimo de terra” ?